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CHEIRO DE CABEÇA

  • Foto do escritor: Pricilla Maria
    Pricilla Maria
  • 7 de abr. de 2020
  • 23 min de leitura

Dedico à Dione Carlos, também escritora negra, que me inspirou a retomar esse conto, antes guardado, nem pela metade, em alguma suíte virtual.


1


Ele andava de um lado para o outro da sala, esperando a ligação.

O cômodo era um depósito velho e tinha um sofá desbotado, que servia de cama, uma mesa de estudos bagunçada e uma estante de livros impecavelmente limpa e organizada. No chão, vários papéis com equações enormes acabavam sob os pés descalços e sujos do jovem.

Leandro era um cientista - ou pelo menos assim se intitulava. Não tinha ido a uma faculdade ou tido qualquer tipo de educação formal para além do ensino fundamental. Mas era inteligente, perspicaz e irritantemente curioso. Isso lhe garantiu uma genialidade não apenas grande, mas sempre em expansão, assim como o Universo que ele gostava de estudar. Nunca fora muito prepotente, como outros gênios costumam ser, mas a verdade é que ele simplesmente tinha preguiça do resto do mundo. As pessoas discutiam horas para chegar em lugar algum, apenas andando em círculos. Onde já se viu alguma ideia nova surgir onde todo mundo concorda? O conhecimento é gerado no debate, nas discussões sadias, no atrito entre ideias dissonantes. Pensar o contrário é ingenuidade.

Por isso, ele era sozinho. A única companhia que não o entediou em nenhum momento foi a de seu irmão caçula. O menino, Altair - nome dado em homenagem ao pai de sua mãe - era estranhamente calmo, em relação às expectativas de Leandro do que seria uma criança. Depois que deixou sua casa, e fez com que a assistência social levasse seu irmão para longe daquele inferno, cheio de bebida e drogas, nunca mais encontrou tanto prazer em estar com alguém.

Ele conversava horas a fio com o menino, que sem dizer palavra, não tirava os olhos do irmão mais velho; talvez em admiração, talvez concentrado em apenas fazer seu cocô matinal. Somente Altair sabia que Leandro gostava de cantar, e que tinha uma voz particularmente bonita para isso. Apenas ele havia tido o privilégio de ouvi-lo, enquanto os dois esperavam Regina, sua mãe, chegar da rua. Leandro não teria como saber, mas a voz dele ressoaria na cabeça de Altair por muito tempo.

Durante essas noites em que Leandro, inevitavelmente, ficava cansado e preocupado com sua mãe, era Altair quem lhe acalmava, quando o garoto achava que fosse o contrário. Era no alto da cabeça de Altair que Leandro se assossegava. O cheiro que saía do couro cabeludo de Altair, um cheiro virgem, que enchia de água a boca de Leandro, e que parecia varrer da corrente sanguínea dele todo o estresse acumulado pela espera e incerteza, era o que separava o irmão mais velho de uma síncope aos onze anos.

Agora, aos vinte e dois anos, tremia de nervosismo ao imaginar que teria que aguentar mais alguns anos de guerra para enfim sair em busca de seu irmão. Aquela ligação era importante; ela poderia mudar não apenas o destino seu e de Altair, mas também de toda a humanidade - ou o que sobrou dela.


2


No dia em que saiu de casa fazia muito calor. Era final de tarde, mas o Sol já não era tão piedoso quanto fora antes atrás. Leandro colocava um pé na frente do outro, sabendo que a cada passo ficava mais longe de um dia rever seu irmão. Partia porque sabia que Regina jamais o perdoaria por tê-la feito perder a guarda de seu caçula; e também porque sabia que não poderia perdoar a si mesmo por deixar o irmão menor - a pessoa que ele mais amou na vida - naquela situação, sem tomar qualquer providência.

Havia feito a ligação há uns minutos atrás, de forma anônima, para a assistência social, informando que na casa número cinco, da Rua da Felicidade, uma criança de apenas três meses de idade estava sendo negligenciada por uma mãe sem dentes, e sem a mínima condição financeira e emocional de lidar com a responsabilidade que uma criança demanda. Ao desligar o telefone se perguntou como ele mesmo havia conseguido sobreviver durante onze anos.

Sua relação com Regina sempre foi muito complicada. Ela tinha vícios desde que Leandro lembrava, desde a época em que eles não tinham problema para colocar comida na mesa. Mas seu vício custou muito dinheiro, mais do que seus pais tinham para manter a família estruturada. Seu pai havia saído, segundo ela, para comprar cigarros há cinco anos. O mais intrigante, para o menino Leandro de seis anos na ocasião, era que seu pai não fumava. A partir de então começou a questionar se Regina mentia para ele. Mesmo com as brigas diárias que antecederam o passeio sem volta de seu pai, era bom tê-lo por perto quando sua mãe surtava em abstinência por falta de drogas ou bebida, ou quando ela levava para casa algum estranho que olhava torto ou sedento para o garoto. Ela e sua companhia noturna e breve, mas nunca a mesma, costumavam ficar algumas horas trancados no quarto do casal, fazendo barulhos estranhos, e seu pai, para poupar a Leandro e a si mesmo da ofensa, saía com o menino e iam até qualquer esquina contar estrelas. As circunstâncias eram ruins, mas essas noites costumavam ser muito agradáveis.

Com onze anos, a idade com a qual saíra de casa, Leandro tinha certeza de que sua mãe mentia para ele desde os seis. Essa resposta já tinha. Entretanto outras nasciam, entre as quais estava aquela que fazia a cabeça de Leandro ferver todas as noites, antes de cair no sono cansada: por que seu pai, que fugia de Regina, não levou Leandro junto com ele? Por que escolheu deixar o menino junto à mãe, que havia dias em que nem lembrava da existência do menino?

Então, ainda menino, sem conseguir nem mesmo manter limpo seu nariz, que volta e meia começava a escorrer muco por causa de uma rinite crônica que carregava, Leandro saiu de casa para o mundo, lugar onde aquela pergunta poderia ser engolida pelo barulho dos carros, pelas cores dos outdoors, e pelo cheiro de esgoto. Para expurgar aquela pergunta tão algoz de sua cabeça, se encheu de tantas outras, e aos poucos foi se tornando um curioso por excelência. Mas, ao mesmo tempo, e talvez o mais importante, foi se tornando um pesquisador e exímio buscador de respostas.

Durante os dias que vagou sem rumo pelas ruas quentes da cidade, começou a pedir comida, e quando não lhe deram, começou a roubar. Roubava apenas comida, nunca dinheiro. Nunca foi muito afeiçoado a isso, apesar de saber de suas necessidades. Durante um desses furtos diários foi pego pelo dono da pequena venda de onde tentava levar um pacote de bolachas. O homem se enfureceu, mas convencido pela lábia do ladrãozinho ranhento que segurava entre suas mãos, decidiu lhe pagar com comida por seu trabalho na lojinha. Leandro percebeu, então, que as palavras faladas, bem organizadas, tinham um poder muito conveniente. Seu Abelardo, o dono da loja e agora seu patrão, foi a primeira pessoa que Leandro conseguiu convencer na vida, e não pretendia parar por ali.

Leandro começou, então, a dormir no depósito de seu Abelardo, que acabou se afeiçoando ao garoto e lhe deu um saco de dormir e um cobertor. Agora ele tinha onde dormir e onde fazer e responder suas questões. O travesseiro - ou melhor, saco de dormir - de Leandro foi seu interlocutor várias noites, até que ele conheceu, enfim, o milagre do livro, e percebeu que não estava sozinho em um oceano infinito em forma de ponto de interrogação. Não que nunca tivesse manuseado um livro na vida, mas no pouco tempo que tinha vivido ainda não havia tido uma relação muito próxima com um. Decidiu, então, que era isso que faria.

Aos poucos, começou a se alfabetizar com o pouco conhecimento que tinha ganhado nas suas poucas idas à escola. Matutava horas para chegar à conclusões que nós, seres alfabetizados o suficiente para ler este conto sem muitas dificuldades, chegaríamos em segundos. E sua cabeça foi se enchendo tanto de perguntas que se esqueceu daquela que pouco tempo atrás o torturava. Ele começou a saber das coisas, e a querer saber cada vez mais.

Leandro só não tinha se atentado de que o que atormentara sua cabeça não era aquela pergunta, mas sua resposta - que ele já sabia, mas que escamoteava para si mesmo: seu pai havia deixado Leandro com sua mãe, simples e exclusivamente, porque não quis levá-lo junto.


3


Quando Leandro tinha dezoito anos a Grande Guerra Inútil estourou. Foi inútil porque ninguém ganhou, e muita gente morreu. Era uma dessas guerras quaisquer que países ricos faziam contra países ricos, para ter acesso a mais dinheiro, e que chamavam de “mundial”, mesmo que nenhum país pobre fizesse parte dela. Quer dizer, não fazia parte diretamente pelo menos, já que os mais pobres eram como estábulos de homens para morrer nos campos de batalha; mas não participavam na hora da partilha dos lucros.

Mas nesta Guerra, em especial, além de os países mais pobres não fazerem parte da divisão dos ganhos, alguns ainda sofreram represálias por se negarem a enviar seus homens para os braços da Morte. E as mais cruéis possíveis, desde embargos comerciais até bombas mortais nas áreas mais populosas das cidades. O país de Leandro foi um dos que mais sofreu com tudo isso e, nesta época, seu Abelardo, que achava que já tinha feito o bastante pelo jovem Leandro, conseguiu - com muita insistência - ajuda de um parente seu que nem gostava tanto dele assim. Foi-se embora, então, para outro país, um que pelo menos não servia de aeroporto de bombas. E deixou Leandro à frente de sua quase falida vendinha, em uma das várias esquinas que haviam na periferia da cidade.

Leandro não reclamou, tinha pelo menos o que comer. Vivia escondido em seu depósito, lendo, relendo, pesquisando, respondendo questões e levantando outras tantas, junto com os livros que arranjava em um sebo na região. Não havia meios para acompanhar o que acontecia, como noticiários ou redes sociais, pois a tecnologia como conhecemos entraria em colapso anos antes, mas Leandro não precisava acompanhar para saber o que acontecia; sabia o que era guerra.

Ao contrário, ele não sabia o que era paz, mas com a guerra estava acostumado. Guerreou por sua vida durante onze anos, enquanto vivia debaixo do mesmo teto que uma mulher viciada em heroína e álcool; guerreou nas ruas, por um prato de comida, contra a fome; e depois contra a descrença de seu Abelardo, que gritava com ele sua dúvida de que Leandro chegaria em algum lugar além do balcão de sua venda, sendo ele preto, pobre e semi analfabeto. Aliás, semi analfabeto até onde seu Abelardo sabia. Leandro agora, além de escrever seu nome completo sem tremer a mão ou engolir letras, fazia equações quilométricas, enquanto se apertava no depósito sujo e sem ventilação, onde fora deixado. Guerreou por muito tempo, e agora buscava não só a sua paz, mas também um caminho prático para acabar com aquela maldita guerra e trazer a paz para todos aqueles que sofriam as consequências dela. E sabia que o único caminho seria o conhecimento.

Em um exercício perigosamente saudosista, Leandro puxou na memória e lembrou da última vez que teve paz. Descobriu, assim, que sabia perfeitamente como era a sensação de ela encher seu peito. Não a tinha sentido por muito tempo, é verdade, mas ela havia lhe acariciado em algum ponto de sua vida: foram aqueles três meses em que pôde segurar Altair nos braços, cantar para ele, e sentir o cheiro doce que tinha o topo de sua cabeça. Se perguntou como poderia um cheiro tão suave - e forte, ao mesmo tempo - ter tanto poder sobre as batidas de seu coração, que diminuíam a medida em que o cheiro adentrava suas narinas e chegavam em seu cérebro.

E ali na linha tênue entre o sono profundo e a vigília, Leandro prometeu a si mesmo que buscaria saber como esse dispositivo funcionava no cérebro humano. Em nome de sua paz.


4


Leandro se preparava para sair, enquanto lá fora o caos reinava. Sempre que saía, precisava usar roupas que ele mesmo havia produzido no depósito que chamava de casa. Usando lonas e pedaços de plástico, que envolvia os produtos a muito entregues na vendinha de seu Abelardo, Leandro costurou milimétrica e cuidadosamente um macacão que protegia todo o seu corpo, e usava fita adesiva para vedar qualquer abertura que poderia passar despercebida. Junto a isto, usava também uma máscara moldada para seu rosto, que fez cerzindo óculos de proteção de mestres-de-obra com uma máscara cirúrgica. Todo esse cuidado era necessário por causa da rinite crônica de Leandro que, se antes apenas deixava seu nariz cheio de muco, agora poderia matá-lo, em um mundo em que hospitais cuspiam pacientes para fora, de tão lotados que estavam de feridos e mortos - alguns de fome. A guerra havia ocupado todos os leitos.

Mas ele precisava correr o risco. Precisava sair e ir ao sebo no qual havia esbarrado sete anos atrás, quando levou o primeiro livro à sua mão. Precisava ir em busca de alguma coisa que o ajudasse a entender o que acontecia com o cérebro de alguém ao cheirar a cabeça de um recém-nascido. A curiosidade tinha virado obsessão durante o sono.

Saiu no sol quente, de 35°, usando a roupa inteira de plástico, que era pesada e dificultava qualquer movimento dos braços. Por dentro da armadura, suava feito um porco. Sentia o filete de suor escorrer por suas costas e aquilo era a única coisa fresca que sentia naquele inferno poeirento. Nas ruas, o que tinha de calor tinha de poeira. A visibilidade era quase nula - uma bomba havia caído na cidade mais próxima, por volta de quatro dias atrás, e havia levantado a poeira densa que cegava Leandro.

Por dentro da poeira, Leandro andou. Com sua roupa de astronauta abatido, Leandro levou quase uma hora para chegar ao sebo. Quando avistou a garagem onde uma mulher idosa, conhecida por dona Lunga, havia aberto um dos sebos mais antigos da região, estranhou o movimento. Um homem, de terno preto, (agora não mais) impecável, estava parado à porta, cobrindo o rosto com o paletó, chamando pela proprietária. Aparentemente, estava interessado na plaquinha, feita à mão, com o nome do sebo - Nova Esperança. O que uma pessoa vestida deste jeito está fazendo na porta desse sebo, nessa nuvem de poeira?, pensou Leandro. E decidiu chegar mais perto para constatar.

- Alô! - Leandro saudou o homem de terno preto, mas ele demorou a perceber de onde vinha a voz. Girou várias vezes em seus calcanhares para conseguir enxergar Leandro. E quando finalmente conseguiu, estava apenas à distância de um passo dele.

- Oh, olá! - respondeu o homem, ao dar um pulinho de susto ao ver Leandro tão próximo de si - Você sabe me dizer se esse sebo ainda está funcionando?

- Está, sim! Eu também preciso entrar…

E depois de olhar o homem que tossia que nem cachorro velho, Leandro completou:

- Mas acho que você precisa entrar mais do que eu.

Leandro buscou a campainha da garagem e achou sem maiores problemas; ele já havia tocado aquele botão em condições de visibilidade muito piores. Algum tempo atrás, havia ficado refugiado dentro do sebo depois de uma bomba quase acertá-lo pela madrugada, enquanto dormia em seu depósito. Acordou com o estrondo ensurdecedor e nem vestiu sua roupa anti-poeira antes de sair dali, tão assustado que ficou. Saiu correndo na tempestade de pó que se formou e bateu a campainha inúmeras vezes antes de dona Lunga lhe atender. Sua rinite crônica atacou seriamente e ele quase viu a Morte; mas depois de tanto remédio caseiro que a velha lhe dava, ele se recuperou. Alguns dias depois conseguiu voltar para casa.

Depois de tocar a campainha cinco vezes, e de o moço do terno bonito tossir umas trinta, pelo menos, Leandro escutou o arrastar dos chinelos de dona Lunga.

- Ela vem vindo - avisou ao moço elegante.

- Oh, graças! - ele estava genuinamente aliviado.

Dona Lunga abriu e o homem praticamente voou para dentro de sua garagem. Ela pôs as mãos na cintura, incrédula.

- Mas que diabos…

Ela era uma senhora encorpada. Naquela quentura, usava uma saia longa como um vestido tomara-que-caia. Era florida, a saia, mas estava surrada e parecia mais um pedaço de trapo do que qualquer outra coisa. Com uma das mãos na cintura, dona Lunga lembrava um daqueles bules de chá abaulados e pequenos; ela não media nem 1,6m. Os cabelos estavam rentes a cabeça em um coque, que escondia sua textura crespa. Assim que olhávamos para seu rosto, sabíamos que dona Lunga era uma senhora cheia das intimidades com as ervas e as rezas. Suas mãos eram pesadas, cheias de vincos e calejadas, mãos de benzedeira, que por aquelas bandas era raro de achar.

Leandro entrou e pediu sua benção de mais velha.

- Oxalá, meu Pai, te abençoe - disse solenemente, quase em reza. E depois continuou: - Onde foi que tu achou esse homem? Olha só! Ele trouxe um caminhão todo de pó aqui pra dentro!

Leandro rascunhou um sorriso no rosto e respondeu que não sabia de onde ele tinha vindo, não, que apenas tinha encontrado ele no portão da garagem.

- Oxe, e o que é que tu quer, hein? - perguntou se direcionando ao homem de terno. Depois olhou para Leandro e, notando que o jovem ainda vestia a roupa desconfortável de plástico, emendou: - E tu tira essa roupa, menino! Não sei o que te mata primeiro, se essa tua bichice que tu tem no nariz ou esse calor do inferno!

De novo, Leandro sorriu, enquanto obedecia sua Madrinha.

O homem de terno se recuperou da tosse e finalmente se apresentou:

- Meu nome é Arthur Monteiro. Eu vim até o seu sebo... - e olhou em volta. Aquilo estava mais para uma garagem com livros entulhados, uns sobre os outros. Suspirou e continuou: - Bom, vim atrás de um livro de ciências. Me disseram que a senhora poderia ter, pois é o único sebo que sobrou aqui na região.

Dona Lunga, que era entendida de outros tipos de ciências, olhou o homem todo emperiquitado diante dela e soube na hora que ele não entendia era nada da ciência que dizia conhecer. Era um daqueles garotos ricos que tem dinheiro o suficiente para mandar alguém fazer seu trabalho e pagar para colocar seu nome.

- Tu veio atrás de livro também, menino? - Perguntou a Leandro.

- Sim, da mesma coisa que ele quer.

- Então tu ajuda ele aí que ele mal abriu a boca e já me deu dor de cabeça.

E saiu da garagem, por um corredor estreito até os fundos de sua casa. Ela deve estar cozinhando alguma coisa, pensou Leandro, e sua boca encheu d’água. Depois ele passaria lá com ela, mas antes disso precisava achar seu livro. Sabia que tinha alguma coisa para ele naquela pilha.

- Você sabe onde estão os livros de Física? - Perguntou Arthur, olhando em volta, em cada pilha que havia em cada canto da garagem. As paredes eram tomadas de livros. As livrarias haviam falido a muito tempo, e todo aquele acervo de livros era, basicamente, o que havia sobrado da grande onda de negação da ciência.

Há pelo menos vinte anos, ou mais, todo e qualquer conhecimento científico foi acachapado ao nível de estupidez. Começou com um movimento pequeno, entre políticos e toda a classe de gestores sociais que, querendo dar prosseguimento à guerra contra os pobres - por mais que dissessem que a guerra era contra a pobreza - conseguiram convencer a maioria da população de que a ciência era uma ferramenta para derrubar o governo, supostamente, zelador dos mais vulneráveis. A partir daí, tudo piorou: escolas e universidades fecharam, livros foram incinerados e tornados obsoletos e o que tomou o lugar do conhecimento, na hierarquia da sabedoria, foi o dinheiro. Não fazia nenhum sentido na cabeça de Leandro, mas agora as pessoas pensavam assim. Com exceção de algumas, claro, como dona Lunga. Não que ela tivesse uma fé inabalável na ciência, longe disso, mas tinha vivido o suficiente para saber que dinheiro normalmente emburrece, e que não eram as mestras juremeiras que ela cultuava no fundo de seu quintal que haviam inventado a bomba atômica.

- Ah, eles podem estar em qualquer lugar. Se eu fosse você, não esperaria sair daqui tão cedo. - Leandro respondeu a Arthur, já se virando para começar sua própria busca.


5


Os dois jovens reviravam a garagem de dona Lunga há várias horas. Nenhum tinha conseguido o que queria, ainda. Leandro percebeu que a busca de Arthur era tão urgente quanto a sua, se não mais. Ele parecia quase desesperado por alguma coisa e sussurrava baixinho: Física, Física, Física. Mas, pelo jeito, não sabia exatamente o que procurava, já que segurava em suas mãos um livro de Matemática.

- Você precisa de ajuda? - Leandro soltou, se odiando segundos depois. O homem poderia tomar toda a sua tarde com isso, e o jovem ainda queria comer fosse lá o quê que sua Madrinha cozinhava no fundo da casa.

Depois de um suspiro pesado, Arthur confessou:

- Preciso de qualquer coisa sobre fusão fria.

- Então você está procurando um livro sobre Física Quântica?

Os olhos de Arthur brilharam.

- Você entende de Física? Está procurando por isso também?

- Não tanto quanto gostaria, infelizmente. Só o que já li em livros. E na verdade, estou buscando um livro sobre Química ou Biologia.

- Então você é um cientista?

- Não, não… - Será que sou? Acho que poderia ser!, pensou Leandro. - Sou apenas um garoto que gosta de ler e que agora está com uma dúvida em particular.

- Que dúvida? - Podia parecer estranho, mas uma dúvida, naquele tempo poderia, ironicamente, trazer muitas respostas. As pessoas andavam sedentas por perguntas.

- Queria saber o que acontece com o cérebro de uma pessoa quando cheira a cabeça de um bebê. Mas acho que ninguém escreveu sobre isso antes… - Disse Leandro, revirando um livro que possivelmente poderia auxiliá-lo.

O olhar brilhante de Arthur esmaeceu e sem curiosidade ele perguntou:

- Ah, é? É esse tipo de coisa que interessa a você?

Leandro não gostou muito do tom sarcástico do branquelo vestido no terno preto, que suava violentamente. O suor pingava em bicas de seu queixo imberbe.

- Você pode até achar besteira, mas é possível que a resposta para o fim dessa guerra esteja nessa questão.

Arthur riu alto, debochado, levando as mãos à barriga e jogando a cabeça para trás. E Leandro lembrou o porquê de não gostar de socializar.

- Tenho certeza de que a resposta de uma guerra mundial está mesmo na cabeça de um recém-nascido… - E balançava a cabeça negativamente.

Mas quando Arthur achou que sua risada tinha constrangido Leandro o suficiente para que ele se mantivesse calado, o jovem disparou, sem nenhuma cerimônia:

- Por isso que a ciência de vocês perdeu a guerra, há tantos anos atrás. Por isso que vocês estão desesperados agora, esquecidos, desacreditados. Vocês passaram séculos dizendo que a ciência era única, e esqueceram-se de que ela não é só o que vocês acreditam; existem inúmeros tipos de ciência, que vem dos mais diversos lugares. Vocês perderam porque tinham apenas uma carta na manga. Se abrissem seus olhos para as demais formas de construir conhecimento, talvez tivessem cartas suficientes para formar um baralho inteiro.

Arthur engoliu em seco. Não esperava essa resposta e jamais havia pensado sob essa perspectiva. Leandro passou pelo menos sete anos lendo, e estudando, tantas coisas quantas ele conseguia. Sua visão era muito mais ampla, apesar de viver trancado em um depósito, ao contrário do homem viajado que era Arthur. Dona Lunga tinha razão: ele realmente era um daqueles homenzinhos que pagam pelo prestígio. Mas, ele também tinha perdido todo seu dinheiro e parte de sua família na guerra, então, sua procura por respostas era uma procura genuína pela paz. Depois que ela chegasse talvez ele voltasse a explorar cientistas de verdade. Mas por enquanto, tudo que ele buscava era a paz. Até porque sem gente para andar sobre a Terra ele não teria público quando o sucesso chegasse.

- Eu tenho um conhecido que é médico, e outro que tem formação em química. Posso apresentar vocês. O que me diz?

- Nossa, você sempre muda de ideia rápido assim ou está só desesperado mesmo? - Dessa vez foi a vez de Leandro de debochar.

- O que você acha?

- Que o desespero pode fazer milagres.


***


Naquele dia, dona Lunga tinha cozinhado uma canjica branca, com leite e coco, um dos manjares mais preferidos de seu afilhado postiço. Misturado com a canela em pó que ela fazia em casa, o mingau era de se comer rezando. Leandro comeu até quase vomitar e sofreu para vestir novamente a roupa de plástico. Antes de vedá-la de vez, pediu a benção de dona Lunga.

- Sua benção, Madrinha.

- Que Oxalá, meu Pai, te cubra com seu Alá. - Solenemente, ela lhe abençoou.

Leandro tinha um carinho muito grande por aquela senhora. Ela cuidou dele como a um filho, mesmo que não morassem na mesma casa. Não era de muitos carinhos, assim como Leandro, então se davam muito bem. Mas naquele dia, ele sentiu alguma coisa a mais no olhar de dona Lunga. Eles pareciam brilhantes demais, como se uma poça de lágrimas estivesse se formando dentro deles. Mas Leandro se convenceu de que aquilo era apenas uma impressão; dona Lunga não chora, oras.

Mas o que Leandro nem sonharia era que dali a poucos minutos, depois que ele saiu da casa de sua Madrinha, uma bomba desgovernada caiu bem longe de seu alvo, em cima da garagem bagunçada, o último sebo daquela região. Os olhos de dona Lunga eram olhos chorosos, sim, porque diferente de Leandro, ela sonhou com aquilo.


6


- ... Então, se usarmos como base o verniz caseoso e conseguirmos - o que eu tenho certeza de que sim - mapear a composição das células epiteliais que se concentram nas glândulas sebáceas do topo da cabeça de bebês recém-nascidos, talvez tenhamos uma chance de reproduzir o cheiro que buscamos. Nossas pesquisas preliminares apontaram esse cheiro é produzido por essas glândulas para que as pessoas não rejeitem os bebês, apesar de toda a atenção e cuidado que eles demandam. Esse cheiro ativa, no cérebro, a área que produz ocitocina, o famoso hormônio do amor. Ele protege contra o abandono e, acima de tudo, faz com que protejamos os bebês. Agora imaginem, seguindo a linha de raciocínio, que possamos produzir esse cheiro de forma massiva, e espalhá-lo pelas zonas onde o conflito está pior. É uma verdadeira chuva de amor! Ao invés das pessoas se matarem irão se proteger.

Houve um silêncio sepulcral. Leandro estava ali, de pé, depois de quatro anos de pesquisa intensa, tentando convencer cientistas, e investidores, ultra conservadores de que uma chuva de amor poderia acabar com uma guerra que já durava quatro anos. Até um terno novo havia comprado para a ocasião, e estava suando violentamente dentro dele. O tempo estava muito quente e, ainda assim, Arthur havia insistido que a imagem que ele passaria seria tão importante quanto o que ele falaria. Que besteira! Sentou-se na mesa, junto com os outros cinco homens ricos - e desesperados - que olhavam para ele com expressões indecifráveis.

- Isso parece romântico demais. - Soltou um dos homens.

- Parece um conto de fadas! - Riu outro.

Mais alguns mililitros de suor escorreram pelo tronco de Leandro. Mas ele fez mais uma tentativa.

- É verdade, não é? Eu devo concordar com vocês. Mas qualquer tentativa de salvar a humanidade, no ponto em que estamos, não pareceria um conto de fadas?

Mais um momento de silêncio.

- Vamos deliberar e avisamos vocês em dois dias. - Disse o manda-chuva do grupo.

Arthur estava em um dos cantos da sala. Parecia sofrer como se estivesse constipado, segurava a respiração sem notar e suas mãos suavam mais que Leandro. Os dois lançaram entre si um olhar de cumplicidade, a fim de se acalmarem. Compartilharam, nesse segundo, esperança.

Depois que dona Lunga morreu, Leandro teve o impulso que precisava para mergulhar de cabeça em sua pesquisa, que foi incentivada incansavelmente por Arthur. Passava, agora, horas a fio com os outros dois pesquisadores - Henrique, o médico, e Jefferson, o químico - procurando fontes, fazendo testes e colhendo dados que aparentemente não existiam na bibliografia escassa que eles haviam juntado durante um ano inteiro. Obviamente, esta pesquisa já havia sido feita, em algum ponto do tempo nos anos em que a ciência ainda estava em alta, mas se perdeu, e teve que ser refeita.

Arthur, apesar de não ser cientista, estava sempre por perto e, em certo ponto, resolveu começar a pagar os três pelo trabalho, em alguma tentativa de mantê-los engajados. Pagava pouco, mas fazia promessas maiores quando o projeto vingasse. Os três, sem outra alternativa de empregos melhores, concordaram. Porém, quando ofereceu o pagamento para Leandro, teve uma resposta inesperada.

- Eu não quero dinheiro. - Respondeu o jovem cientista. Mas completou: - Guarde. Guarde até que cheguemos nos resultados que buscamos. Aí, então, você me dá.

Arthur não acreditava no que ouvia. Leandro, nitidamente, precisava de roupas novas, de comida e, além disso, sair do depósito onde insistia em morar.

- Nada disso é importante, Arthur. Eu quero outra coisa em troca do trabalho na pesquisa.

- O quê?

- Quero que você descubra onde está meu irmão.

Arthur, que nem sequer considerou que Leandro tivesse qualquer tipo de laço de parentesco, franziu o cenho em dúvida e olhou para ele curioso.

- Você tem um irmão?

- Tenho, mas eu não o vejo há onze anos.

Arthur viu nos olhos de Leandro que aquilo era importante para ele, mais do que se alimentar ou vestir roupas novas.

- Tudo bem. Combinado. Preciso do nome dele e saber onde o viu pela última vez.


7


E lá estava ele, esperando a ligação.

Lá fora o barulho das bombas tinha finalmente dado uma trégua. Então, ele conseguia ouvir sua própria respiração pesada. Estava se recuperando de uma crise de sua rinite crônica. Andava de um lado para o outro, tentando controlar sua respiração, pois quanto mais a ouvia, mais ficava nervoso.

E enfim o telefone tocou. Era Arthur.

- E então? Eles…

Arthur mal deixou Leandro terminar sua frase.

- Sim! Aceitaram. Começamos a próxima fase na segunda-feira!

Leandro mal cabia em si. Sentiu o chão ceder sob o peso de seus pés. O coração palpitou alegre e um sorriso se desenhou no rosto sisudo dele.

- Mas eu quero que você se sente agora, Leandro. Tenho uma outra notícia.

Leandro suspeitava que Arthur estava chegando cada vez mais perto do rastro de Altair. Será que seria agora que ele diria que encontrou o menino?

- Encontrei o lugar para onde Altair foi mandado. E ele está vivo.

Leandro suspirou, aliviado. Era a frase mais esperada por ele nos últimos anos. E Arthur continuou.

- Ele está em um lar de adoção na cidade próxima. Ainda é muito perigoso de chegar até lá, então ainda não podemos ir encontrá-lo. Mas assim que tudo isso passar, será a primeira coisa que faremos.

Leandro podia esperar.

- E quanto ao dinheiro que eu pedi para você guardar para mim nesses anos?

- Está aqui, Leandro. Tudo muito bem guardado. - Garantiu Arthur.

- Pois bem, eu quero que você mande este dinheiro, todo ele, no nome do menino, para esse orfanato, por enquanto.

Arthur calou-se por um tempo. Era o que ele fazia quando não concordava com o que Leandro havia pedido - e Leandro odiava isso. Depois, gaguejando, quis se certificar:

- Tem certeza disso?

- E quando foi que eu não tive certeza do que estou fazendo?

Mais silêncio e, por fim, Arthur concordou e desligou.

Finalmente, Altair estava dentro de seu radar, aquele pedacinho de paz. Leandro mal podia esperar para cheirar sua cabeça de novo. Mas antes que pudesse fazer isso, tinha que se certificar de que o menino permaneceria vivo. Para isso, trabalhou mais um ano inteiro sem descanso, até que sua “chuva de amor” finalmente ganhou vida e os resultados dos testes de mostraram satisfatórios.

8


Pelo menos dez dirigíveis sobrevoaram a área do país onde os conflitos estavam concentrados. Dirigíveis cinzas enormes, de quase quinhentos metros de comprimento cada e com dispositivos que liberavam, em forma de chuva, verniz caseoso, repleto de lanugem, direto nas cabeças dos homens que ali embaixo se matavam. A chuva caía em pancadas leves, mas suficientes para encharcar os homens, suas armas, e o chão. Misturar o cheiro de cabeça de bebês com cheiro de chuva e terra molhada daria um bônus para a operação. Cheiro de chuva também acalma, agora isso era cientificamente comprovado.

Aos poucos, o cheiro de cabeça de bebê exalou de todos os lugares. Vinha do céu, da terra molhada, e também do topo da cabeça dos homens. Eles começaram a se locomover com mais lentidão, parando, analisando aquela chuva. Começaram a sentir a boca encher de água, e os sentidos se abrirem para as sensações que a chuva trazia. Alguns lembraram de suas mães, e se sentiam acolhidos nos seus colos. Outros, lembravam-se dos filhos, e estes podiam ser identificados pela posição que seu corpo fazia: com um braço por cima do outro, na altura do peito, fingiam embalar uma criança e começavam a cantar cantigas de ninar. As armas calaram, só a chuva falava. Os homens que estavam em suas trincheiras e esconderijos saíram deles para entender o que estava acontecendo. Ao serem tocados pela chuva arriavam as mãos, deixando suas armas caírem no chão e apontavam a cabeça para o céu, em busca daquele cheiro que além de entrar macio em suas narinas, os abraçava.

Leandro tinha realmente inventado uma chuva do amor. Ele era reticente quanto a este nome; concordava que parecia realmente uma chuva de contos de fadas. Mas era isso que ela era, nada mais, nada menos: uma chuva que fazia o amor em forma de hormônio, a ocitocina, correr pela corrente sanguínea das pessoas, enchendo suas bocas de água, acalmando seus batimentos cardíacos e apagando da memória o porquê de os homens se matarem entre si.


***

Várias operações como aquela foram necessárias, até que a guerra finalmente acabasse, mas depois de fazê-la em toda a região mais próxima, Leandro fez questão de ir com Arthur até o orfanato onde supostamente Altair estava. Apesar do medo de Arthur e da poeira que ainda era densa nas estradas, os dois foram. A estrada castigava, mas não mais que o calor. Apesar da chuva, o tanto de radiação jogado no ar aqueles anos de guerra, tinha superaquecido toda aquela região. Demoraria mais alguns meses até normalizar. Mas Leandro mal dava importância para isso, tão entusiasmado que estava em encontrar Altair. o menino nem se lembraria dele, tinha certeza, mas estava disposto a conquistar o menino da forma que fosse. Imaginava que ele não fosse um menino difícil de lidar, levando em consideração aqueles três meses nos quais Leandro e ele passavam vinte e quatro horas por dia juntos.

Depois de quase três horas de viagem, Leandro e Arthur chegaram ao dito orfanato. A fachada do prédio estava descascada e sem reparos, e parecia quase vazio. Alguns meninos tomavam sol na varanda, e eles pareciam brutalmente maltratados. Suas feições eram fechadas, defensivas. Não pareciam falar muito. Não daria para saber se eles se batiam entre si ou se eram surrados por alguém mais velho. Com medo de meninos de nove ou dez anos - Leandro riria disso depois - os dois amigos se aproximaram. Leandro, com a voz trêmula, perguntou pelo irmão, de nome Altair, que teria por volta de onze anos. Por favor, digam que vocês o viram!, a cabeça de Leandro implorou, mas sua boca não declarou seu medo.

Um deles, o que parecia ser o líder, carregava uma faca na mão esquerda, e não parecia se incomodar com o sol batendo direto no seu rosto e peito, raquítico, de criança. Ao contrário, parecia se deliciar enquanto sua pele queimava com aquela radiação toda. Ele respondeu Leandro, entre dentes:

- Aquele covarde é seu irmão? Dá pra ver! - E soltou um riso malicioso. - Não queríamos ele aqui. Você chegou tarde demais. Ele foi mandado embora ontem à noite. Uma hora dessas já deve ter morrido de sede debaixo desse calor.

Leandro sentiu o calor esmagá-lo, o chão abriu novamente sob seus pés e ele se sentiu afundar. Arthur o segurou firme e o arrastou de volta para o carro. Fazer uma guerra parar foi bem fácil perto do que seria aguentar o fato de que por muito pouco ele perdeu novamente seu irmão de vista.


Alguns quilômetros a leste dali um dirigível pairava sobre o céu avermelhado, trazendo a chuva de amor de Leandro para banhar os soldados que ainda restavam no campo de batalha. Escondido dentro de uma loja de conveniência abandonada, Altair estranhou o silêncio que subitamente se fez. Logo depois, o som da chuva no telhado. Levantou do chão devagar e olhou para fora. Sim, chovia. Mas porque havia cessado o fogo? Será que a paz finalmente chegara? O menino atravessou a loja e sorrateiramente saiu para o pátio do posto de gasolina onde a loja ficava. A chuva começou a molhar o corpo magro e torturado do menino, e ele sentiu aquele cheiro. Sua boca encheu de água, seu sorriso voltou a riscar o rosto, depois de muito tempo escondido. O cheiro que ele sentia era familiar: era o cheiro do peito de seu irmão, Leandro, que o aninhava e batia tranquilo, quando ele ainda era um bebê. O som da chuva fez coro, então, para a voz doce de Leandro, aquela voz que cantarolava em seu ouvido há onze anos atrás.


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